
Há lugares que não desaparecem — apenas aprendem a respirar debaixo d’água. Sobradinho é um deles.
Entre histórias de famílias arrancadas da terra e promessas que nunca chegaram a se cumprir, o conto acompanha a figura teimosa e solitária de Pedro Bento, um homem que se recusa a abandonar o chão onde nasceu. Enquanto todos partem, ele fica: por fé, por orgulho, por memória — ou por algo que nem ele saberia nomear.
Quando a água sobe, não é com violência. É com silêncio. Um avanço lento, inevitável, quase educado, como se o próprio rio estivesse medindo os passos de alguém que não quer assustar. E, nesse silêncio, dizem que outras presenças também foram engolidas: homens soterrados nas obras, promessas partidas, vozes que nunca encontraram descanso.
O lago cresce, cobre janelas, telhados, árvores. E guarda histórias que o tempo não levou — apenas afundou.
Alguns juram que, em noites de lua, ainda se vê o reflexo torto de uma casa que não deveria estar ali. Outros escutam batidas sob a água, como se alguém insistisse em voltar.
Em Sobradinho, a tragédia não é estrondosa: é líquida.
E o medo nasce no que a água consegue esconder — e no que, às vezes, se recusa a afogar por completo.