
Há histórias que nascem da terra seca, do vento que arranha o rosto, das lembranças que insistem em voltar mesmo depois de décadas de silêncio. Esta é uma delas — não sobre a caatinga em si, mas sobre o que ela faz com quem a carrega por dentro.
A narradora caminha pelos caminhos brancos de Tubatinga como quem revisita um território íntimo, feito de areia, de saudade e de culpas antigas. Ali, entre seriguela e Vaza Barris, ela guarda uma lembrança que jamais encontrou repouso: o encontro com uma das filhas de seu Lindauro — uma menina de tranças, flores no cabelo e uma doçura que escondia tensões que ninguém ousava nomear.
O que poderia ter sido apenas um afeto clandestino se transforma em algo mais profundo: uma fissura no tempo, um ponto de fratura onde desejo, medo e silêncio se tocam. E, quando uma tragédia desfaz o mundo como ela o conhecia, tudo se mistura — a dor, a vergonha, a culpa, a areia que massageia os pés como se tentasse apagar rastros humanos.
Quarenta anos depois, voltar à Tubatinga não é retornar ao passado, mas ao lugar onde a narradora se perdeu de si mesma. A caatinga, testemunha muda, parece lembrar de tudo: dos passos, dos segredos, dos nomes que o tempo tentou enterrar.
Neste conto, o terror não vem de assombrações.
Ele nasce da memória — dessa que nunca morre, mesmo quando a gente passa a vida inteira tentando enterrá-la sob a areia branca da serra.